#365Posts – Em vez de religião, ensinem programação

Quem se lembra dos áureos tempos do Jurisdiquês sabe que eu não tenho talento nem pra divertir as pessoas com propostas estapafúrdias de reforma social, política, ou qualquer que seja com relação à coletividade. Tampouco tenho o dom de elaborar projetos sérios que demandem lidar com a burocracia do sistema vigente.

Segundo me lembro, e corrijam-me se eu estiver errado, a famigerada Lei de Diretrizes e Bases diz que as escolas têm que permitir a matrícula facultativa na matéria de ensino religioso. É inegável que é melhor que seja facultativa do que obrigatória, mas o ideal, em minha não nada humilde opinião, seria substituir esta matéria por ensino de lógica de programação.

Ensino religioso não deveria ter espaço na escola

Sou da opinião que ensino religioso é algo para ser feito nas igrejas e nas casas das famílias, jamais na escola.

Quando a escola se propõe a ensinar religião para crianças pequenas só tem a escolha de incutir pensamentos e ideias nas cabecinhas dos petizes, que ainda são incapazes de escolher criticamente o que é melhor para si. Infelizmente, a maioria dos adultos não tem essa capacidade, tampouco, mas o que quero dizer é que essa responsabilidade é dos pais, exclusivamente, e não da escola.

Qualquer um pode levar o boi até o rio, mas ninguém pode obrigá-lo a beber água.

SARMENTO, Jaime

Em segundo lugar, religiosos são pessoas muito suscetíveis quanto à fé que professam. Não vou entrar em detalhes, mas é só olhar e ver a quantidade de gente odiando e matando em nome do “amor divino”. Daí a expor as crianças a conflitos que elas não precisam vivenciar, ou a relatos de violência dos quais a escola deve idealmente proteger os infantes, em vez de os esfregar na cara deles.

Em terceiro lugar, mas não menos importante, o ensino religioso na escola não terá nem meio por cento de influência na formação do bom caráter dos jovens, pois quem quiser ser religioso o será pela influência do convívio familiar; e sobre quem não quiser usar a religião para justificar seu bom caratismo só posso lembrar do ditado que meu pai usava sempre: qualquer um pode levar o boi até o rio, mas ninguém pode obrigá-lo a beber água.

Em resumo: é perda de tempo e de dinheiro ensinar na escola algo que não será de utilidade na vida do cidadão, além de ser cruel com um professor que poderia estar fazendo algo mais útil e gratificante (a não ser que ele seja um fanático religioso, mas “professor” e “fanático” são palavras que jamais deveriam descrever o mesmo ser humano).

Por que ensinar lógica de programação

Por mais que queiramos negar, a inclusão digital veio para ficar. É raro que uma família de classe média ou com mais poder aquisitivo não tenha um computador. Mesmo nas classes sociais menos favorecidas a penetração da Internet e das redes sociais é um fenômeno inegável. A maioria das escolas já conta com laboratórios de informática, quase todos subutilizados.

Familiaridade com computadores todas as crianças têm, aceite a escola ou não, e ensinar a elas como produzir o essencial das ferramentas de que necessitam para tirar mais proveito do computador tem uma série de efeitos positivos.

A começar pela autoestima: no momento que a criança aprende a programar algo, por mais simples que seja, isso dá a ela a sensação de poder, de importância; em vez de ser mera consumidora do que os outros lhe enfiam goela abaixo, agora ela é um indivíduo capaz de dizer ao computador como comportar-se, e como executar a tarefa que ela, agora autora e não mais consumidora passiva, deseja.

O processo de fixação de conhecimentos de outras matérias também fica favorecido, principalmente as ciências exatas: quando uma criança vai escrever um algoritmo para resolver um problema matemático qualquer, ela tem que raciocinar tanto e dividir o problema em partes menores tão eficientemente que é impossível que não aprenda a resolver o mesmo problema sem o auxílio do computador.

As crianças eventualmente acabam por tornar-se multiplicadores: as que têm mais facilidade passam a ajudar as que têm desempenho mais mediano, e até mesmo a competição saudável que se cria as faz desenvolver o intelecto, a lógica e a capacidade de argumentação.

O ensino de lógica de programação nas escolas também ajuda a identificar talentos. Profissionais da área de desenvolvimento de software precisam de dedicação e estudo, mas talento também é extremamente importante.

As dificuldades iniciais

Os cri-críticos (todas as pessoas que não concordam integralmente com minhas ideias, e que usam de argumentos para refutá-las) podem argumentar que seria difícil impor uma mudança dessas, que o ensino religioso é sim importante (porque é — os religiosos sempre justificam as coisas com “porque sim” ou equivalente), que não haveria professores com formação adequada, faltaria computador para todo mundo, etc.

O fato é que computadores que há meia dúzia de anos eram topo de linha hoje são ultrapassados para o uso da maioria das pessoas e empresas. Mas isso é uma questão do mercado, que cria necessidades cada vez mais crueis para obrigar as pessoas a consumirem cada vez mais. Não quer dizer que estas máquinas sejam sucata inútil.

Com um pingo de boa vontade qualquer um conseguiria dezenas de doações de computadores que não servem mais em algumas empresas, mas que podem ser perfeitamente adequados às necessidades de quem estiver dando os primeiros passos na seara da programação.

Quanto à mão de obra, falo por mim e por muitos colegas de profissão que conheço, que não se furtariam a dar algumas aulas semanais em caráter voluntário, para ensinar às crianças os rudimentos da programação de computadores.

A questão, primeiro, seria de boa vontade.

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1 comentário
  • TICs em Educação Responder

    Opa Janio, A Fundação Mozilla tem esta proposta: Ensinar Programação na Escola. http://psfl.in/h- Linguagens e dispositivos para praticar é que não vai faltar!

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