Vacina para COVID-19 em clínica particular: tomar ou não?
Até o momento o Brasil não tem vacinas, nem seringas, nem calendário de vacinação, nem definiu logística de distribuição, nada. Ainda assim, os rumores mais recentes dão a entender que clínicas particulares poderão disponibilizar a quem puder pagar a vacina para a COVID-19, antes de ou simultaneamente à vacinação oficial promovida pelo SUS.
Até ontem, literalmente, eu pensava que quando houvesse a possibilidade da vacinação particular eu usaria as moedas de Caronte, contrairia empréstimo, ou o que fosse necessário para imunizar meu corpo e o das pessoas que amo e com quem convivo mais proximamente.
Contudo, existe uma forte possibilidade de que vacinar-se quem possa pagar em clínica particular nem tenha efetividade contra a doença.
O que acontece é que vacinação para ser eficiente contra uma epidemia ou pandemia qualquer precisa de um alto volume de pessoas imunizadas na sociedade, pois diferente de tratamento ou remédio, que são individuais, as vacinas são uma medida coletiva: haja vista cada organismo ter suas particularidades, é provável que, assim como algumas pessoas têm contato com o vírus, mas não desenvolvem doença, existam as que tenham contato com a vacina mas não desenvolvam imunidade.
Assim, um baixo volume de vacinados (abaixo de 70% ou 80%) implica dois grandes problemas potenciais:
- O vírus continua circulando com a mesma intensidade, infectando as pessoas não vacinadas, e talvez botando em risco as que, a despeito da vacina, não desenvolveram imunidade;
- existe alta probabilidade de essas poucas pessoas vacinadas levarem o vírus a uma mutação que inutilize todos os esforços de imunização envidados por governos, indivíduos e mesmo pela rede privada de vacinação.
Não é o caso de pensar “farinha pouca, meu angu primeiro”, mas sim de entender como funcionam os vírus — conhecimento que a Humanidade já detém há décadas — e agir de maneira inteligente contra seu comportamento natural.
O desmonte do SUS

Ademais, existe outra questão muito importante que não pode ser desconsiderada: os interesses abjetos na destruição completa do Sistema Único de Saúde, uma das maiores conquistas da sociedade brasileira, algo de que muita gente fala mal sem sequer fazer ideia do que diz.
O governo da morte, ao incentivar de mil maneiras o desrespeito às regras sanitárias de higiene e distanciamento que são as mais efetivas ferramentas para frear o número de infecções e de mortes, aposta suas fichas no pânico que muitas pessoas têm de morrer vítimas da COVID-19.
O medo é uma emoção muito poderosa, e por mais que eu precise ser lembrado constantemente disso, tenho por objetivo não fazer julgamentos nem desqualificar os medos alheios. E se uma pessoa minimamente bem informada não estiver apavorada com a possibilidade de vir a intubar-se devido à COVID, então essa pessoa deve ter um problema forte de dissociação da realidade.
Usando esse pânico generalizado os interessados no desmonte do SUS poderão facilmente fazer uma parcela muito expressiva da população apoiar “espontaneamente” qualquer medida de privatização, assim como já fazem contra os Correios, que se privatizados vão isolar definitivamente muitas comunidades afastadas, alijando-as de sua cidadania.
O certo a se fazer
Enquanto redijo estas linhas, acredito que a única coisa certa a se fazer seja cobrar vacina para toda a população, gratuitamente, ao mesmo tempo.
Não sou muito fã de pregar para convertidos, usando minhas redes sociais como púlpito para discursos que já são naturais àqueles com quem convivo e que escolhi seguir. Nem acho que isso tenha qualquer eficiência.
Entretanto, todos temos representantes nas casas legislativas, e é deles que devemos cobrar atitudes firmes de defesa do Sistema Único de Saúde, e quanto à eficiente, irrestrita e imediata vacinação. Até mesmo a parcela mais canalha dos parlamentares molha as calças ante a possibilidade de perder eleitores de maneira massiva, e essa deveria ser nossa arma para pressioná-los a agir em defesa dos interesses da população mais desassistida.
Apesar de que isso, de certa forma, é uma hipocrisia minha, já que em toda minha vida escrevi uns dois ou três e-mails para o deputado que ajudei a eleger, e ante a inexistência de qualquer resposta simplesmente deixei para lá.
Por favor, façam o que eu digo, mas se não der para ir tão longe pelo menos façam o que eu faço. Obrigado.