Como Retomei Minha Carreira Sem Querer

Quando eu tinha meus vinte e poucos anos, decidi que nunca mais trabalharia com computadores. Depois de anos alternando entre consertar hardware e escrever código — às vezes ambos no mesmo dia — eu estava exausto. Drivers com defeito, cabos embolados e reparos em equipamentos que nem deveriam ter dado problema já tinham passado do limite.

Naquela época, trabalhava com contrato para a prefeitura, lidando com tarefas de backend que sugavam minha energia. Um dia, entrei no escritório, deixei meu crachá, empacotei minhas coisas e fui embora. Não fiz planos, só saí. Naquele tempo nem se usava a palavra “tecnologia” — chamavam de “informática” — e eu queria me afastar completamente da área.

No caminho para casa, parei para almoçar com a mochila cheia de papéis e bugigangas de escritório. Encontrei um conhecido dono de uma sorveteria e contei que havia pedido demissão. Ele disse que era uma coincidência boa, pois precisava de alguém para cuidar dos pagamentos, do estoque e das vendas. O trabalho era simples, rotineiro e sem pressão. Perguntou se eu podia começar naquela tarde.

Aceitei. A loja ficava ali perto de casa e a tarefa parecia direta: nada de máquinas, telas ou correções de emergência. Apenas papel, números e um ritmo previsível.

Quando cheguei, vi a realidade. Dois computadores empoeirados, desligados num canto. O resto funcionava na base do improviso. Pedidos, entregas e pagamentos eram anotados em papel ou guardados na memória de alguém. Não havia registros, só costumes repassados como tradição.

Para entender o funcionamento da loja, eu precisava de informações. Como não havia dados, fiz o que sabia fazer: criei um sistema.

Pelos doze meses seguintes, dividi meu tempo entre programar e cuidar das operações. Montei uma plataforma simples para gerenciar estoque, contabilidade, fluxo de caixa e controle de acesso. Não foi por saudade de programar ou vontade de melhorar processos. Era só a forma mais prática de manter a empresa funcionando.

Essa foi minha única pausa real na área de tecnologia. Durou 36 horas.

Não voltei por falta. Voltei porque, mesmo tentando sair, o trabalho seguiu comigo.

Algumas pessoas escolhem um caminho. Outras são levadas por ele até parar de negar que já é o seu.

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