Deixa o povo curtir o natal em paz!

Todo ano é a mesma coisa: chega o final do ano e o povo de maneira geral enlouquece por causa da ceia de natal (e demais festejos da época), e algumas pessoas desperdiçam uma puta oportunidade de ficar calados criticando o povo por fazer coisas populares.

Não estou me referindo à desde sempre sem graça e anacrônica polêmica das uvas passas na comida, até porque quem faz qualquer comentário deste tipo normalmente está falando da própria ceia, e não da dos outros.

Outro dia li um textão de um jornalista que admiro, em que ele dizia basicamente:

• Jesus provavelmente seria assassinado numa quebrada se voltasse hoje;
• as pessoas passam 364 dias sendo egoístas e defendendo tortura e higienismo social, mas no dia do natal fazem “caridade” para afagar seu ego;
• as escolhas para a ceia não têm nada a ver com a cultura do brasileiro, com sementes oleaginosas e frutas secas que combinam com o inverno setentrional, não com o calor do verão tropical;
• o dinheirinho extra que as pessoas recebem elas torram em ceia, festejos e presentes, e já entram o ano devendo;
• que Papai Noel é garoto propaganda da Coca-Cola;
• e mais um monte de coisa que nem vale a pena eu puxar da memória agora.

É provável que tudo seja verdade, mesmo. Algumas coisas indubitavelmente são. Mas e daí?

Pergunto a cada um que faz esse tipo de crítica: é com o teu dinheiro que as pessoas estão fazendo caridade hipócrita no natal? É com teus recursos que elas estão comprando castanhas e nozes? És tu quem pagas os boletos das pessoas depois da virada do ano?

Em geral, as pessoas passam o ano todo na expectativa de que alguma coisa aconteça que as tire da pindaíba em que se encontram: um milagre, um golpe de sorte, ou uma política pública qualquer que seja pensada e executada tendo em vista melhorar a vida do pobre. Mas não acontece nada.

Aí as pessoas vão cansando, e ficando cada vez mais desesperançosas, ao ver que todo o seu esforço do ano todo resultou em nenhum progresso, ou até em algum retrocesso de vida. E então chega o natal, aquela época em que elas fazem das tripas coração para ter por uma noite uma refeição como elas gostariam e merecem ter sempre que quiserem, com fartura, com variedade, com alegria. É o melhor jeito que as pessoas encontram de renovar a esperança para o ano que vai chegar igualzinho aos outros, com tendências a piorar.

Por que querer tirar essa alegria do povo? Por que criticar, se é com o dinheiro delas que as pessoas fazem suas festas como podem? Por que privá-las da catarse que apenas as festas de fim de ano e o carnaval podem lhes proporcionar?

Deixa o povo em paz! Cada um que se meta com sua vida, e o natal de todos há de ser melhor. E com sorte o espírito de cada um cuidar do próprio rabo até se estende por alguns dias de janeiro, já pensou que lindo seria?