O aniversário do menino
Aproveitando os últimos dias da estada em Ribeirão Preto fui com um amigo jantar em um conhecido restaurante da cidade, que não é dos mais “chiques” (porque não dá para suportar aquela gente empertigada que frequenta este tipo de lugar, tampouco pagar o absurdo que cobram pelo que servem) mas tampouco é fuleiro. Sempre tem bastante movimento, principalmente de galeras de empresas que vão comemorar ou confraternizar lá.
Chegamos, o restaurante estava cheio, e acabamos ficando numa mesa meio xoxa no fundo do salão. Na mesa à minha frente, às costas de meu amigo, uma família: um menino, um casal de adultos e uma senhora. Presumi tratarem-se dos pais e da avó do garoto.
Notava-se de longe que o moleque estava constrangido, no meio daquele monte de adultos, ninguém da idade dele, haja vista ele estar cabisbaixo o tempo inteiro. Logo ficaria evidente o porquê: era o aniversário dele e em vez de uma festa com as coisas que ele gosta, estava em um restaurante frequentado por velhos (o guri devia ter, no máximo, onze anos).
Descobri ser o aniversário dele, porque uma das meninas que trabalham no atendimento aos clientes veio da cozinha com um sorvete enorme, enfeitado não com uma cereja e sim com uma vela! Postou o artefato diante do garoto e acendeu o pavio, ao que os três adultos começaram a cantar “parabéns a você” bem baixinho — e o pai em vez de bater palmas gesticulava, sinalizando para cantarem mais baixo ainda.
Então, a mesa ao lado ouviu a cantoria, deduziu ser o aniversário do jovenzinho, e juntaram-se em coro. Meu amigo e eu fizemos o mesmo, e em menos de três segundos o restaurante inteiro estava homenageando o pequeno aniversariante.
Eu gostaria de ter palavras para descrever o sorriso que o moleque pôs na cara quando todo mundo parou para cantar-lhe parabéns.
Se em vez da vida real estivéssemos em uma película estadunidense, seria mais ou menos como se tivesse acontecido na vida dele um daqueles milagres de natal, quando a coisa mais impossível do mundo acontece para fazer o protagonista mirim o serzinho mais feliz e iluminado da terra.
Por mais piegas que possa parecer — e não estou nem aí para o que as pessoas pensam, até porque a maioria não pensa com frequência — a cena foi emocionante.
Dava para perceber no olhar e na expressão do moleque: num instante o constrangimento máximo de estar no meio de um monte de anciãos de vinte anos de idade para cima, no dia que deveria ser o mais importante; no outro, ele era o centro das atenções, ovacionado e aclamado.
Duvido que o guri venha a esquecer esta surpresa de aniversário que lhe fez uma multidão.
E eu com isso?
Depois de jantar saí para dar uma caminhada, aproveitando a temperatura amena que a cidade tem à noite, e fiquei escutando o que eu sentia com relação a este acontecimento, que se balançou as estruturas do aniversariante, com certeza pelo menos tangenciou algo na minha própria alma.
Descobri que se o projeto de rapazola ganhou um presente inesperado em seu aniversário, deu a mim um tão inesperado quanto, sem nem imaginar.
De fato, ao ver a alegria estampada naquele rostinho infantil, que não sabia para onde olhar enquanto cantavam em sua homenagem, encontrei em mim mesmo a alegria de saber que, em algum recanto de minha própria alma, repousa um guri que se emociona e fica feliz com surpresas tolas, que não custam um centavo e não requerem mais do que a espontaneidade alheia. E é extremamente bom saber que, apesar de tudo, esse guri de minha alma está são e salvo, e alegrando-se imensamente ao ver outro menino experimentar alegria.
E a chama da esperança se mostra acesa, mais forte, como a dizer que nunca se apagou, por mais que eu, adulto e guarango, faça questão de ignorá-la ocasionalmente.