Personal Friend ou Amigo de Aluguel
Não sei onde foi que eu vi, numa sala de espera talvez, uma chamada a uma matéria de um cara no Rio que estaria forrando o bolso exercendo a atividade de “amigo de aluguel”. Dei uma pesquisada por estes termos no Google, e acabei descobrindo que as mentes criativas já deram um nome em Inglês para a atividade: “personal friend”. Ora, existe algum “friend” que não seja “personal”? O pleonasmo foi proposital, para forjar uma afinidade com “personal trainer”? Não seria mais adequado chamar a tal profissão de “friend for rent”?
Elucubrações linguísticas à parte, a profissão de amigo de aluguel parece estar ganhando algum mercado, e ao procurar por estes termos no Google o que mais se encontram, no momento em que redijo este texto, são anúncios de pessoas que se propõem a exercer o papel de amigo mediante o pagamento de honorários.
Uma das matérias mais interessantes que li a esse respeito trata de uma maneira bem bacana o assunto, abordando de leve aspectos éticos, morais e até mesmo profissionais desta nova profissão. Éticos e morais, porque na maior parte das vezes este profissional é visto como um aproveitador, que explora o bolso dos desafortunados que não têm a mesma sorte que eu, de saber cultivar bons amigos (tenho os melhores amigos do Universo, e esta não é uma metáfora), e não raro a profissão é confundido com prostituição, como acontece com aqueles infindáveis anúncios de “massagistas” que aparecem no jornal.
A meu turno, digo que me parece é que o nome dado à atividade está errado.
Amizade não tem preço. A minha, pelo menos, não. Minha amizade é algo que eu dou sem esperar nada em troca. O “pagamento” pela minha amizade é meu amigo aceitar receber esse Amor. O significado da palavra Amizade, etimologicamente falando, é “sentimento fiel de afeição, simpatia, estima ou ternura entre pessoas que geralmente não são ligadas por laços de família ou por atração sexual, além de ser entendimento, concordância”. Ora, meus sentimentos não estão à venda, reitero, e tenho certeza que tampouco estão os de todos os amigos que tenho!
Entretanto, esta profissão tem seu mérito e seu valor. Por exemplo, um amigo de aluguel costuma ir a cinemas e teatros com seus clientes, costuma fazer refeições, costuma ouvir os problemas e queixas do cliente, e quando tem condições acaba dando sua opinião, aconselhando, influenciando a vida do outro. Acontece que nem sempre as pessoas têm a disponibilidade de ir caminhar calmamente no parque, às três horas da tarde. Nem sempre nossos amigos podem ou querem ir ao cinema ver aquele filme sobre diversidade sexual rodado em Los Angeles na década de 70.
Um amigo de aluguel (continuo defendendo a tese de que este nome é péssimo), contudo, não vai ter que se desviar de sua rotina profissional para amparar quem precise bater um papo para aliviar a dor de corno, ou para dividir a angústia e a ansiedade geradas por uma mudança iminente: passar o tempo falando com as pessoas sobre isso é a sua rotina profissional. Há ainda caso de estadas curtas em cidades estranhas (no sentido de desconhecidas, não necessariamente de esquisitas), quando uma pessoa com menos facilidade de relacionar-se pode ficar sentido-se extremamente solitária.
Aliás, por falar em cliente, muitas críticas são direcionadas a estes, no que diz respeito aos “personal friends”. Muita gente critica dizendo que jamais contrataria um profissional destes (como se pagar por este serviço fosse errado), mas que exerceria a profissão numa boa. Em outras palavras, o cliente é um inútil que não sabe conquistar um amigo de verdade para os momentos de solidão ou necessidade, mas não tem problema nenhum em arrancar dinheiro deste tipo de gente, cobrando pelo que normalmente se faria de graça.
Em muitas situações as pessoas precisam de outra pessoa para desabafar, para falar sem serem interrompidas, sem necessariamente quererem passar pelo processo de análise de um psicólogo, por exemplo. Noutras tantas, é muito difícil para uma pessoa que tem um “problema” social que em sua cabeça pareça grave abrir-se com um familiar ou amigo mais próximo, como é o caso de homossexuais ainda no armário. Ou, ratificando o que falei acima, numa estada curta em uma cidade diferente, a pessoa pode precisar de quem a leve para jantar, divertir-se, quem a guie nos programas culturais pela cidade.
Aliás, pensando em situações eu me imagino exercendo esta profissão, e deparando-me com um cara com algum segredo realmente terrível, como se ele tivesse matado alguém, fosse traficante de escravos, ou vivesse de pedofilia. Eu não tenho dúvidas de que denunciaria o sujeito para as autoridades, mas fico pensando se tal denúncia não feriria a ética entre prestador e tomador de serviço.
Enfim, com este nome eu não exerceria a profissão, pois amizade não tem preço, e seu valor é inestimável e inexpressável. “Acompanhante” também não daria, porque já virou sinônimo de prostituta ou michê. Mas de fato sou simpático à ideia de que existam pessoas que se dediquem à atividade de ouvir outras pessoas, e podendo ganhar seus caraminguás com isso.
Só não dá é para confundir papéis, e querer substituir anos de estudo e preparo (necessários para formar um psicólogo) por boa vontade e tempo livre: certas coisas carecem ser tratadas por profissionais, e cabe não só ao prestador de serviços esse discernimento, mas em grande parte também à principal parte dessa equação, o cliente.